Como vem acontecendo desde janeiro de 2013, o governador Jaques Wagner (PT) e o prefeito ACM Neto (DEM) passaram parte do dia juntos ontem. Foram à inauguração da Praça Irmã Dulce, no Largo de Roma, e mais uma vez estavam lado a lado na entrega do título de Patrimônio Imaterial Nacional à Lavagem do Bonfim, na Colina Sagrada. Mas, hoje, cada um vai marcar espaço na mais famosa festa religiosa da Bahia, vitrine disputada por políticos, sobretudo em ano eleitoral.
Eles, que demonstram alta sintonia na esfera administrativa, vão mostrar que a aliança termina quando entra em cena disputa pelo poder. Wagner sai juntos com seus aliados; Neto, com os dele. Será a primeira vez que ambos, que praticamente não se desgrudam nos eventos públicos, vão estar no mesmo local, mas separados, cada qual no seu bloco.
Antes de disputarem espaço e atenção de eleitores no Bonfim, os dois mantiveram o tom amistoso entre eles. Eram só elogios entre si durante a entrega do título e na Praça Irmã Dulce.
De um lado, Neto lembrava “como é importante as esferas de poder trabalharem juntas”. Do outro, Wagner concordava: “Isso que o prefeito falou é verdade. Na hora que você tem que governar, o povo não quer saber de briga. Na hora da eleição, cada um toma seu rumo”. Quando o assunto foi o Bonfim, o tom foi outro.
“Cada um faz o seu e o povo bate palmas para o que está sendo feito”, declarou Wagner. No mesmo compasso, Neto disse ser impossível evitar a separação na Lavagem. “Já é uma tradição. É natural que cada partido político caminhe junto com seus militantes. Administrativamente, graças a Deus, nós continuamos muito bem, trabalhando pela cidade, somando forças. Agora, como é tradição, cada um vai no seu bloco”, afirmou o prefeito.
Prévia
A disputa por espaço político que caracteriza a Lavagem começou ontem, durante a entrega do título de Patrimônio Imaterial à festa. Com seu candidato ao governo, Rui Costa, a tiracolo, ressaltou as realizações do seu governo na área da cultura. “Eu queria falar da minha alegria como governador. A Festa do Senhor do Bonfim é o terceiro tombamento cultural nesse período de sete anos que eu estou à frente do governo. Já fizemos o tombamento da capoeira, dos afoxés”, lembrou.
Para a Lavagem, Wagner vai levar como reforço a ministra da Cultura, Marta Suplicy (PT), que participou ontem da cerimônia. Marta, contudo, se esquivou da disputa política e mirou o discurso na Lavagem. “Uma festa como essa, que desde 1745 se fortalece, se recria, tem muito a nos ensinar”, disse.
Este ano, quem terá um novo aprendizado é a senadora Lídice da Mata (PSB). Pela primeira vez desde que o PT tomou o poder na Bahia, ela não caminhará ao lado do governador e dos históricos aliados petistas já que se lançou candidata a governadora. Lídice vai para o cortejo ao lado da ex-ministra do Superior Tribunal de Justiça Eliana Calmon, nome do PSB para o Senado. Lá, ambas testarão a popularidade frente aos adversários Rui Costa e o vice-governador Otto Alencar (PSD), concorrente direto de Eliana.
Oposição
O cortejo da base aliada ao PT terá que enfrentar, no Bonfim deste ano, uma oposição mais unida e menos tímida desde a vitória de Neto, com o DEM, PSDB e o PMDB marchando juntos. Apesar de disputarem internamente a vaga de candidato na ala, o peemedebista Geddel Vieira Lima e o democrata Paulo Souto decidiram caminhar juntos.
Enquanto oposição e governistas se preparam para marcar território, Neto disse ter outra meta no cortejo: sentir o termômetro popular após um ano de governo. “A Lavagem é um momento para renovar a nossa fé no Senhor do Bonfim, que é o mais importante, mas também abraçar as pessoas, receber sugestões, conversar com o povo, sentir a vibração das ruas. Gosto da festa como cidadão mais até do que como político. É nesse espírito que vou”, disse, um dia antes da festa, quando o espírito político costuma falar bem forte.
Título dá maior visibilidade à Lavagem, diz ministra
O título de Patrimônio Imaterial Nacional para a Festa do Bonfim foi entregue ao bispo auxiliar de Salvador, dom Marco Eugênio, pela presidente do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), Jurema Machado, e pela ministra da Cultura, Marta Suplicy.
Para a ministra, o título permite que a festa alcance visibilidade maior em todo o país e obtenha notoriedade em escala internacional. “Não é só um reconhecimento ao povo baiano, mas à humanidade da festa, e é uma forma também de torná-la mundialmente conhecida”, disse Marta, durante a cerimônia na Igreja do Bonfim, que ficou ontem lotada de fiéis e autoridades.
Na solenidade, a presidente do Iphan afirmou que a capacidade de se recriar a cada ano, sem esquecer a tradição, garantiu o título à festa. Jurema Machado explica que o tombamento assegura o compromisso do Iphan com a festa. “Para o Iphan, representa o compromisso com os organizadores, com todo o rito, trajeto, para que fique a cada dia mais rica e renovada”, afirmou.
Para o prefeito ACM Neto, a festa de hoje ganhou um brilho a mais com o tombamento. “Salvador é o berço da religiosidade. Sem dúvida, ficamos muito sensibilizados com esse reconhecimento”, disse. O governador Jaques Wagner aproveitou para lembrar que a Lavagem deste ano marca o retorno, depois de 20 anos, das fitinhas do Bonfim originais, feitas em algodão e fabricadas na Bahia, ao contrário das produzidas em São Paulo com material sintético, de maior durabilidade. “Agora, elas vão partir mais rápido e os desejos também serão realizados mais rapidamente”, brincou o governador, sobre a crença que tornou a fitinha famosa em todo mundo.
Fonte: Correio Bahia